
Cristiane de Oliveira e Laura, de 11 anos. Foto: Arquivo Pessoal
Última modificação em 13 de maio de 2025 às 15:11
Cristiane de Oliveira é mãe da Luara, uma menina de 11 anos que carrega em si uma força tão grande quanto o amor de sua mãe. A trajetória das duas é marcada por desafios diários, mas também por momentos de fé, aprendizado e superação.
Cristiane sempre sonhou em ser mãe. O positivo no teste de gravidez foi recebido com alegria, pois a gestação foi planejada com cuidado. Ela havia parado o anticoncepcional, casada há quase dois anos, pronta para viver essa nova fase.
“Foi um momento muito feliz. Nós estávamos esperando por ela. Era uma criança muito desejada”, lembra Cristiane.
Luara nasceu saudável, de cesárea, com 39 semanas. Os primeiros meses foram como em qualquer outra família: expectativa, amor, cuidados e muitas descobertas. Luara andou com um ano, como o esperado, mas não desenvolvia a fala. Resmungava, mas não formava palavras.

Diagnósticos e descobertas
A primeira convulsão, com um ano e dois meses, veio acompanhada de febre. A segunda, um mês depois, foi sem febre, e acendeu o sinal de alerta. A busca por respostas levou a família a uma série de exames. A tomografia revelou uma suspeita de hidrocefalia, mas o diagnóstico foi colocado em dúvida por especialistas.
“Eu via outras crianças com hidrocefalia, com o perímetro encefálico aumentado, com válvulas. Não era o caso da minha filha”, conta Cristiane.
Uma médica mais experiente trouxe uma explicação mais precisa: Luara tinha uma má formação cerebral inespecífica no lado esquerdo, o que causava acúmulo de líquido na região. Isso confundia os exames de imagem. Enquanto tentavam entender a condição neurológica, Luara começou a fazer terapias.
Foi durante esse processo que surgiu a suspeita de autismo. O pai de Luara voltou de uma palestra e disse: “A nossa filha é autista”. Cristiane entrou em negação. Apesar de ser professora, sabia pouco sobre o TEA.
Depois de muitos exames, veio o diagnóstico oficial: Transtorno do Espectro Autista (TEA). Mais tarde, vieram o TDAH (Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade), o TOD (Transtorno Opositivo-Desafiador) e, por fim, a deficiência intelectual. A confirmação formal desta última só veio no ano passado, mas já era percebida pela família.
“Foi um processo muito difícil, muito doloroso. A gente sonha com uma criança e, de repente, tem outra realidade diante de si. É como viver um luto, mesmo com a criança nos braços,” desabafa Cristiane.

Uma rotina de luta e conquistas
A nova realidade exigia mais do que aceitação. Cristiane precisou agir. Conseguiu um plano de saúde, enfrentou negativas e barreiras burocráticas. A virada aconteceu quando uma decisão judicial derrubou o limite de sessões de terapia para crianças autistas. A partir daí, Luara pôde acessar o tratamento adequado.
“Lutei muito para garantir as terapias certas para minha filha. Foram muitas noites sem dormir, idas e vindas a médicos e planos de saúde. Mas eu não podia desistir dela,” conta emocionada.
A família adaptou a rotina. Montaram um cronograma de terapias, ajustaram a dinâmica da casa, buscaram escolas inclusivas e construíram uma rede de apoio. A comunicação com a escola e com familiares foi essencial para que todos compreendessem as necessidades de Luara.
Durante a pandemia, em 2020, veio uma nova conquista: a terapia ABA (Análise do Comportamento Aplicada), feita em casa. Luara começou a usar a Comunicação Alternativa e Aumentativa (CAA), e isso mudou sua forma de se expressar.
“Quando ela começou a se comunicar, mesmo que não fosse falando como outras crianças, foi como se o mundo dela se abrisse. A gente passou a entender o que ela queria, o que sentia, e isso mudou tudo,” lembra Cristiane.
Hoje, Luara recebe acompanhamento com psicóloga, fonoaudióloga, terapeuta ocupacional, fisioterapeuta, ecoterapia, terapia alimentar e apoio escolar. É participativa, incluída nas atividades escolares e segue evoluindo com o tempo.
“Tudo ainda é um processo de adaptação, mas é possível. Cada conquista dela é uma vitória nossa também,” afirma a mãe.

Rede de apoio, fé e esperança
Cristiane transformou sua dor em ação. Entrou para uma associação de pais e começou a lutar por políticas públicas que garantissem direitos a crianças com deficiências. Participou de debates, ajudou a mudar realidades e continua trabalhando por mais inclusão.
“Eu sempre falo para as mães que estão começando essa caminhada: não desanimem. O começo é muito difícil, parece que a gente perde o chão. Mas também é nesse momento que a gente precisa levantar e lutar pelos nossos filhos,” afirma.
Os desafios continuam: filas longas no SUS, falta de acesso a terapias especializadas, preconceito e sobrecarga emocional. Muitas mães não têm condições de trabalhar ou arcar com os custos dos tratamentos. Cristiane, que é servidora pública, reduziu sua carga horária graças a uma lei, mas sabe que essa não é a realidade para todas.
Ela também fala da importância do autocuidado. Durante muito tempo, só pensou na filha, até entender que sua própria saúde mental era essencial.
“Aprendi que não dá para cuidar da minha filha se eu estiver mal. Precisei entender que, para ela estar bem, eu preciso estar bem também,” diz Cristiane.
A espiritualidade também tem papel importante em sua trajetória. A fé a fortalece nos momentos difíceis e a ajuda a seguir em frente.
Cristiane encerra com um recado às mães que estão iniciando essa jornada. “A luta é grande. Eu não vou mentir e nem dizer que é fácil. É uma batalha todos os dias. Mas é uma luta que vale a pena, porque é pelo direito do seu filho, pela qualidade de vida dele.”
E reforça. “Brinquem com seus filhos, vivam momentos com eles. Não excluam, não escondam. Façam com que eles se sintam pertencentes, amados, aceitos.”
Por: M3 Comunicação